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Fidel, Allende, Revolução, Golpes e Contrar-Revolução na América Latina

Fidel, Allende, Revolução, Golpes de Estado e Contrar-revolução na América Latina


Entrevista histórica dupla com Allende e Fidel, ao jornalista chileno e assessor pessoal de Allende, Augusto Olivares, acontecida em novembro de 1971. Aqui reproduzida pela TV pública argentina que recebeu o nome de "El Dialogo de America". A conversa foi realizada nos jardins do palácio presidencial, onde temas como "A via chilena para o socialismo" e os obstáculos para sua realização foram refletidos pelos dois estadistas.
https://www.youtube.com/watch?v=BLoIwfSV0PY


Aos 21:17 pergunta Augusto Olivares: A experiência política chilena é seguida com muita atenção em todo o mundo. É uma experiência que tem obstáculos. Como podem vocês definir esses obstáculos?

Allende: Três minutos para definir os obstáculos de uma revolução que tem que ser feita dentro de uma democracia burguesa e com os instrumentos legais dessa democracia? No entanto tu sabes perfeitamente bem que avançamos. Os obstáculos nascem de quê? Em primeiro lugar, de uma oligarquia com bastante experiência, inteligente, que defende muito bem seus interesses, e que tem respaldo do imperialismo. Dentro do marco de uma institucionalidade em que o Congresso possui pesos e atribuições e onde o governo não tem maioria. Então, o governo tem dificuldades bastante sérias que fazem que o processo revolucionário chileno, dentro dos marcos dessa legalidade, encontre, a cada dia e a cada momento, obstáculos para o avanço do programa da Unidade Popular. Por exemplo: é certo que obtivemos um despacho de uma lei no Congresso da lei que permitia nacionalizar o cobre, mas quando buscamos o caminho de comprar as ações dos bancos, dos monopólios, já nos encontramos com obstáculos, com resistência, e o parlamento exigiu que se fizesse uma lei que determinasse caso por caso e uma lista determinada das empresas que iriam formar parte da área social. Você compreende Augusto Olivares que as dificuldades em nosso caso também estão em relação com uma liberdade de imprensa que é muito mais que uma liberdade de imprensa, que é uma libertinagem da imprensa. Deformam, mentem, caluniam, tergiversam. Os meios de difusão com que contam são poderosos! Jornalistas vinculados aos interesses externos e aos grandes interesses nacionais. Não só não reconhecem, como também, eu repito, deformam nossas iniciativas. Temos nós que respeitar as conquistas que o povo alcançou. Das quais fazem uso e mal uso a oposição ao governo popular. Por isso, as dificuldades que se apresentaram a nós são bastante grandes.

Fidel: São admiráveis as dificuldades de vocês.

Augusto Olivares: Presidente, apesar desses obstáculos, pode-se avançar em direção ao socialismo?

Allende: Avança, eu já disse. O cobre é nosso, o ferro é nosso, o salitre é nosso, o aço é nosso. Ou seja, as riquezas básicas nós temos conquistado.

Fidel: Aqui há uma questão importante sobre essa pergunta que fez Olivares sobre a “via” e as dificuldades e da marcha do processo. E que o povo chileno em meio a toda essa tradição da estabilidade de suas instituições, de seus partidos de esquerda organizados conseguiu fazer uma aglutinação de forças suficientes para obter a vitória no campo eleitoral e que efetivamente empreendeu uma série de mudanças estruturais muito importantes e algumas de grande transcendência histórica, como a recuperação do cobre, do salitre, do controle dos bancos, todas essas medidas afetaram profundamente os interesses dos monopólios, dos EUA, e afetaram também os interesses dos setores oligárquicos do país. Entre eles as medidas de aplicação em um ritmo maior da lei da reforma agrária. E essa situação engendra uma grande resistência desses interesses, que além de tudo controlam, como dizia o presidente, grandes recursos para a luta, partidos também tradicionais, com experiência, habilidade, um controle majoritário dos meios de divulgação de massa, experiência na arte de disseminar os temores, de explorar a ignorância. Todos esses fatores constituem obstáculos formidáveis.

Allende: Perdão, é preciso reconhecer que esses partidos tem conseguido conquistar setores da população, as pessoas com menor consciência, alguns setores do campesinato. Você sabe que existe no Chile uma porcentagem alta de analfabetos, gente que não tem conseguido se incorporar plenamente a luta do povo.

Fidel: Eu tenho a impressão que essa resistência apela aos procedimentos clássicos dos mais avançados, que é um procedimento que nós qualificamos de fascista. E que tratam portanto de ganhar as massas, massa com uma demagogia voltada aos setores mais atrasados das camadas humildes e ganhar massas nas camadas médias. Então agora falta uma questão por demonstrar: Se esses interesses se resignarão passivamente as mudanças de estrutura que a Unidade Popular e o povo tem desejado levar adiante. E é de se esperar que nós analisemos teoricamente essa questão, que exista resistência forte e inclusive exista resistência violenta. De maneira que esse é um fator que não se pode descontar em absoluto da atual situação chilena, do meu ponto de vista, que é um ponto de vista de um visitante, vindo de um país que está em outra condição, que é como a viagem de um mundo para outro mundo.

O debate inteiro é muito rico e destacamos apenas esse tema estratégico, cujas concepções contrarrevolucionárias de concessões crescentes à direita e o pacifismo conduzem a capitulação, muitas vezes sem lutas e pavimentando o terreno do Golpe de Estado e da reação fascista, como aconteceu recentemente no Brasil com Dilma e o PT. O tema é plenamente vigente para a reconstrução da militância de esquerda que derrotará o atual regime de exceção implantado no Brasil e a ascensão do fascismo no mundo e vai muito além do debate entre pacifismo e luta armada.

Mesmo alertado por Fidel do risco de que os fascistas não se resignariam pacificamente diante da “via pacífica para o socialismo” de Allende, o presidente chileno - ao contrário de armar o povo para resistir ao ameaça do ataque violento da burguesia, como fez Fidel na invasão da Bahia dos Porcos pelos gusanos armados pela CIA – desarmou os cordões industriais chilenos através de uma Lei de Controle de Armas, sobre a justificativa de que o armamento do povo “provocaria a direita”.

No 5o. ponto de reivindicações da "Carta dos operários dos Cordões Industriais a Salvador Allende" se lê claro repúdio a "lei maldita" do Controle de Armas. O documento inteiro de críticas fraternas dos operários a Allende vale a pena ser lido e estudado por todos os que desejam lutar contra o Golpe hoje.
http://www.socialismo-chileno.org/.../cordones_sag_5_9...
Chile 1972-1973: Revolución y contrarrevolución

Allende foi assassinado no Palácio presidencial, tendo nas mãos uma metralhadora que havia lhe presenteado Fidel, pelos golpistas a mando de Pinochet, seu general de confiança.

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